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FOTO DO DIA - GP DE MÔNACO DE 1984
Aqui estão os dois principais personagens daquela corrida. Ayrton Senna e Stefan Bellof deixaram neste dia o mundo da Fórmula 1 de boca aberta com suas performances em condições dificílimas. Para muitos, a interrupção da prova tirou o que era uma vitória certa do brasileiro. Mas, olhando os fatos sem emoção, a informação de um mecânico da Toleman de que seu carro estava prestes a quebrar mostra que o final antecipado da corrida acabou sendo até benéfico para o brasileiro. Confira o que escrevi sobre o assunto em uma coluna do GP Total publicada no final de 2004.
“O Grande Prêmio de Mônaco de 1984 foi uma das maiores loterias da história. Foi também a corrida em que Ayrton Senna convenceu ao Brasil e ao Mundo que era realmente um piloto especial. Era sua primeira vez no circuito do qual se tornaria o maior vencedor da história, anos depois. Classificou-se em 13º no grid e na largada já pulou para a nona posição. As condições do clima eram realmente péssimas no Principado e vários pilotos abandonaram após escaparem no piso molhado. Um dos lances mais divertidos ocorreu com Niki Lauda: na 23a volta, o austríaco rodopiou na freada da curva do Cassino e sua McLaren estacionou exatamente junto à guia, em frente às escadarias que dão acesso ao saguão do luxuoso Hotel de Paris. Só faltou Lauda descer do cockpit de sobretudo, chapéu e um cachimbo para uma cena surrealista, típica dos filmes da Jacques Tati.
Alheio à comédia dos outros, Senna ia ganhando suas posições e se aproximava perigosamente do líder Alain Prost, quando a corrida foi interrompida. Pelo ritmo do brasileiro, a ultrapassagem era questão de uma ou duas voltas. A decisão do diretor de prova, o belga Jacky Ickx, gerou muita controvérsia. Me lembro até hoje da manchete da Folha de S. Paulo no dia seguinte: “Patriotada francesa tira vitória de Senna”. Ironicamente, Prost acabou perdendo o título mundial daquele ano por meio ponto. Tivesse o GP de Mônaco durado mais sete voltas antes da bandeira vermelha, a pontuação distribuída seria completa. O francês teria chegado em segundo lugar e seria o campeão da temporada.
A teoria conspiratória contra Senna, adivinhem, virou verdade absoluta para a maioria de seus fãs. Afinal, uma vitória de Prost em Mônaco seria motivo de festa na França. Imagine só se ele saísse humilhado por um semi-desconhecido de uma equipe com poucos recursos. O próprio piloto gesticulou pedindo o fim da corrida, pouco antes da bandeira vermelha ser acionada. Sem falar no fato de Ickx ser contratado na época pela Porsche, justamente a fornecedora de motores da McLaren. Que canalhice, né?
Não é. Os números mostram que a decisão de Ickx foi mais do que acertada. Duas voltas antes da interrupção, a chuva, que era forte, apertou ainda mais. Nestas passagens, todos os pilotos, sem exceção, marcaram tempos cinco segundos acima do que registraram nas voltas anteriores. No site Atlas F1, um membro da cruz vermelha monegasca, que atuou na corrida, afirmou ter conversado depois com figuras importantes da organização do evento. Segundo eles, a decisão de parar a prova já surgiu na volta 20 e ficou inadiável quando começou a cair mais água. “É preferível parar a corrida uma volta cedo demais do que uma volta tarde demais", disse Ickx.
Na minha opinião, a interrupção daquele GP de Mônaco na 31a volta foi a melhor coisa que podia ter ocorrido a Ayrton Senna. Seu cartão de visitas estava dado e admirado. Mas, se a prova continuasse, seu desempenho seria ofuscado pelo do alemão Stefan Bellof. Vejamos: nas quatro voltas anteriores ao final antecipado, aquelas em que Senna decepava sua desvantagem para Prost, Bellof descontou 3s5 em relação a Senna, quase um segundo por volta. Neste ritmo, o alemão chegaria no brasileiro em questão de 20 voltas (ou por volta da 50a das 78 previstas). E, conhecendo os dois, não haveria a chance de uma ultrapassagem ser negociada, em especial naquelas condições: ia ser batida na certa. Será que Jacky Ickx não anteviu esta possibilidade?
Mas há outro elemento que confirma de forma contundente a sorte de Ayrton Senna. Após a corrida, o mecânico da Toleman John Walton procurou seu colega Nigel Steer, da Tyrrell, para lhe informar que Bellof seria o provável vencedor da corrida. Em uma das passagens pela chicane após a túnel, quando perseguia Keke Rosberg, Senna havia danificado bastante sua suspensão dianteira direita – para quem não lembra, a TV mostrou claramente o momento em que o brasileiro sacudiu seu Toleman ao passar sobre a zebra. Segundo Walton, era questão de voltas para que a suspensão cedesse. A história está documentada em uma biografia de Ken Tyrrell, escrita por Maurice Hamilton.
Como Prost também enfrentava problemas, com os freios, seria Bellof quem brilharia ao assumir a liderança e, provavelmente, vencer a prova. Mesmo com a equipe tendo seus resultados desconsiderados posteriormente (correu a maior parte do ano com o carro abaixo do peso), na hora seria a consagração de um novato cheio de talento e ótimo na chuva. Mas este novato não seria Senna. O primeiro grande show do brasileiro terminaria ofuscado pela performance do alemão. Sem falar no risco de acidente quando a suspensão quebrasse de vez. Já imaginou se fosse na saída do túnel? Karl Wendlinger, lembram?
Desta forma, acredito que Senna deu uma sorte tremenda com a decisão de Ickx em interromper a prova. Saiu consagrado como o mais promissor talento da nova geração e principal nome para o futuro da categoria. Bellof não teve a mesma chance. A ironia macabra: o alemão morreu em Spa-Francorchamps no ano seguinte, negociando uma ultrapassagem justamente sobre Ickx. Quem tem motivos para não gostar de quem?”
9 comentários:
"A sorte acompanha os vencedores"....também concordo que Senna teve mais sorte do que teria sido prejudicado nessa corrida. Vejamos um outro caso clássico, mas em q a sorte não ajudou: Donnignton 93...chovia mto, e outro estreiante fazia uma corrida de deixar a banca de boca de aberta...era Barrichello, em sua terceira corrida, mas a 4 voltas do fim teve um problema no pescador de gasolina...qdo estava em terceiro lugar a frente de Alain Prost e sua Williams de outro mundo. Barrichelo também é um ótimo piloto, mas como disse no começo, a sorte acompanha os vencedores.
Ico,
Na época foi comentado que o Jackie Ickx tomou uma punição de seis meses por ter encerrado essa corrida. Você sabe se isso foi verdade?
Nada mais a declarar ou comentar.
Bom texto.
Revi essa corrida há cerca de algumas semanas, e minha opinião é semelhante à exposta, com exceção à questão de Bellof chegar em Senna ou vencer.
Um acidente com o alemão, tal qual o ocorrido com Mansell na subida da Beau Rivage, parecia mais provável. Assim como um vencedor pelo acaso, como em 1982 com Patrese.
Esse grande texto é definitivo sobre esse assunto.
Wallace Michel
Milton, Ickx foi suspenso sim e a história é saborosa. Quem mais fez barulho contra o final antecipado da prova foi o presidente da FISA, Jean-Marie Balestre. "É inadmissível que a mesma pessoa seja diretor da corrida de Mônaco, comentarista da tevê francesa e piloto contratado da Porsche". Balestre deu à Ickx uma multa de 6 mil dólares e cassou sua licenca de diretor de prova até o fim do ano.
"Ué, mas o Balestre nao era aquele que protegia o Prost", alguns devem estar se perguntando. O buraco é mais embaixo: na época, o chefe do Automóvel Clube de Mônaco aspirava a presidência da FISA. Com a controvérsia no final, o esperto Balestre aproveitou para dar uma licao no rival e usou Ickx como bode espiatório.
Comentário de Niki Lauda - que disputava o título com Prost - após saber das acoes de Balestre contra Ickx. "Um absurdo. A paralisacao foi corretíssima. Um diretor de prova nao pode, e nao deve, levar em conta o andamento da corrida para tomar uma decisao, mas decidir espontaneamente quando a coisa ficou perigosa demais. Foi o que Ickx fez".
Isso é para ver como nós, pobres torcedores, ficamos sabemos de metade da história ou, na maioria das vezes, não ficamos sabendo de nada. Eu lembrava dessa suspensão do Ickx, mas nunca soube da briga dos cartolas.
Valeu!
Oi, Ico, agora que descobri seu blog. Trabalhamos juntos no JT, ambos em come�o de carreira. Muito legal seu blog, parab�ns. S� queria dizer que n�o me lembro do pr�prio Ayrton reclamar da interrup�o, ou dizer que foi patriotada, pelo contr�rio. Ele falou algo, em tom de bom humor, como "gra�as a Deus que acabou antes, se continuasse, eu ia terminar era batendo" ou algo assim. Eu n�o sabia porque o Ayrton tinha sentido al�vio pelo fim da prova, agora com seu texto e a informa�o do t�cnico da Toleman esse ponto est� esclarecido. Valeu! Abra�os.
Oi Jana, bemvinda a este espaco! Legal contar contigo aqui.
Abs!
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