terça-feira, 15 de março de 2011

GANBATTE KUDASAI!

Há dias ficamos boquiabertos com as imagens que chegam do Japão. Terremoto, Tsunami, vazamento radiativo: uma inacraditável sucessão de acontecimentos que está colocando à prova os nervos de um povo conhecido por sua incrível paciência. A sensação de impotência diante de algo que foge ao controle de todos é muito aflitiva.

Eu já vivi um terremoto e tenho alguma ideia sobre isso. Na madrugada 14 de agosto de 2003, a terra tremeu na escala 6.2 num epicentro perto da ilha de Lefkada, na Grécia. Eu estava ali perto, em Kefalonia, e fui acordado pela tremedeira da cama. Tudo muito rápido, não chegou a dar um minuto: deu tempo de levantar e sair correndo para a rua antes do tremor parar. Sorte que a região já havia sido fortemente destruída por um terremoto ainda maior em 1953 e, desde então, todas as construções foram feitas para suportar as intempéries das placas tectônicas.

Os relatos que chegam de Tóquio dão conta que o tremor que chegou na casa de 9 da escala Richter durou mais que três (!) minutos. Só isso dá uma dimensão do tamanho do que aconteceu. Depois foi a força inacreditável de um Tsunami que varreu cidades inteiras como se as casas fossem feitas de papel. Para piorar, os efeitos destas duas tragédias destruíram os dispositivos de segurança dos reatores da usina atômica de Fukushima e a preocupação agora é evitar uma enorme tragédia nuclear nos moldes de Chernobyl - ou pior, dada a alta densidade demográfica do Japão.

No ano passado, fiz uma jornada inesquecível por um país encantador. O que mais me chamou a atenção foi a visita ao Museu do Memorial da Paz em Hiroshima. Foi tocante ver como existe uma preocupação de manter a tragédia e os horrores de uma bomba atômica sempre frescos na cabeça das pessoas para que isso nunca mais se repita. Li ainda no final do ano o ótimo livro “O Último Trem De Hiroshima”, trazendo os relatos dos sobreviventes desta cidade e de Nagasaki. O Japão enfrenta agora uma segunda tragédia nuclear, desta vez no Norte do país.

Colocar a culpa nos próprios japoneses por construírem usinas atômicas numa terra propensa a terremotos é ser hipócrita e simplista demais. Diante das quantidades imensas de energia que a humanidade consome, esta alternativa é comum em todos os cantos do planeta: Europa, Estados Unidos e mesmo no Brasil, onde os militares ainda fizeram o favor de construir uma usina justamente entre as duas cidades mais populosas do país - e num lugar chamado Itaorna. Tivessem algum conhecimento de Tupi-Guarani, saberiam que o significado da palavra é “pedra podre”, porque os índios sabiam que o solo ali é absolutamente instável. Há dois verões a região de Angra dos Reis foi severamente castigada por deslizamentos de terra, um problema recorrente no Brasil. Se parte da enorme montanha acima dos reatores de Angra resolver ceder, será que a estrutura vai agüentar? Você se sente seguro?

O ponto central do que está acontecendo no Japão é esse. A questão energética é algo que deve ser debatido com urgência e a busca por energias alternativas limpas deve nortear esse trabalho. O que você pode fazer para ajudar? Comece cobrando os políticos da sua cidade, estado, país, estudando as propostas que cada um tem para o assunto antes de digitar seu voto na urna eletrônica. Com os dois principais partidos do Brasil, o PT e o PSDB, apoiando a construção desse verdadeiro assassinato ecológico chamado Usina de Belo Monte - só para atender aos interesses de vários setores, principalmente das grandes construtoras, que contribuem para suas campanhas - você pode ter uma ideia do trabalho que temos pela frente.

Importante vai ser também ficar de olho no que vai acontecer no Japão nos próximos meses. Uma das coisas que mais me chamou a atenção naquele povo é sua capacidade de aprender em cima de erros e de fatos; e de pensar no bem coletivo antes do individual. Talvez o palco da tragédia de hoje vai nos apontar os caminhos a se seguir amanhã. Fica a nossa torcida para que esse processo de lidar com emergência, de aprendizado e de reconstrução ocorra da forma mais suave e menos danosa possível. Ganbatte Kudasai!

10 comentários:

Anônimo disse...

Ico, acompanho seu blog há alguns anos.... sempre muito bom e de excelente gosto musical... Tbm admiro esse povo...
Kudasai me fez lembrar do K. Crimson que imagino que vc goste tbm...Mando essa boa versão de Matte Kudasai http://www.youtube.com/watch?v=PDdJFXsJVaQ
Marcelo Farah

Dé Palmeira disse...

Bacana Ico.

Mas os japoneses são humanos e sujeitos a toda sorte de erros. O silencio do governo em torno da eminente catástrofe nuclear não é apenas demonstração de Zen Budismo.

HIDEKI KATIKI disse...

Parabéns Ico...
Boto toda a fé no meu povo!!!
Abçs

Anônimo disse...

Ótimo texto até o quinto parágrafo, porque no sexto foram só contradições. Bom, se não é pra fazer usina nuclear (o que eu concordo) a primeira alternativa seria uma usina hidrelétrica, mas você vai contra. bom, não entendi...

Anônimo disse...

Ao amigo acima, o problema não são as hidrelétricas,mas a forma como belo monte foi sendo concebida.Projetada num local que obviamente não é o ideal, atropelando todas as normas técnicas,alimentada pelo lobby político, uma verdadeira tragédia ambiental como bem disse o ico. As hidrelétricas são boas, mas devem ser seguidas regras para que beneficiem o maior número de pessoas em termos de capacidade com menor dano ambiental.É possível, basta seriedade e comprometimento.

Aline disse...

Ico, parabéns pelo blog. Sempre passo por aqui e acho maravilhosa essa mistura de informação e música de qualidade. Hoje, confesso: fico tocada com cada demonstração tua de apreço sincero pelo povo japonês.Como descendente,me sinto mais que vulnerável e impotente neste momento, a preocupação quando se tem familiares envolvidos numa situação dessas é dose... Espero que a tragédia maior não ocorra pois muito estrago já foi feito, mesmo para eles é algo que foge às rédeas. Te desejo tudo de bom,Ico.

Guilherme disse...

Parabéns pelo texto, Ico! Nossa matriz energética precisa ser vista com muito planejamento e sabedoria.

Ico (Luis Fernando Ramos) disse...

Aos anônimos (um questionou, o outro respondeu), o ponto é justamente este: a Usina de Belo Monte é um desastre ecológico anunciado por especialistas do Brasil e do Exterior. E os Edisons Lobãos da vida insistem no projeto para estofar seus já polpudos bolsos - aparentemente com a benção do governo federal. Note que minha crítica não é específica ao PT ou a Dilma, pois o próprio Serra deu sinais na campanha que também tocaria o projeto. Isso é o que preocupa, o comprometimento dos políticos no Brasil é exclusivamente o de se perpetuar no poder a qualquer custo, mesmo na base de medidas completamente danosas para a Nação. Não dá para ficar quieto.

Abs!

Guilherme Gall disse...

A histeria que se instaurou na mídia nos últimos dias é impressionante. Estão praticamente torcendo por uma nova Chernobyl.

Mas a situação não é bem essa. Indico esses 2 textos como contraponto a todo esse catastrofismo que está por aí:

http://radiacaodefundo.haaan.com/2011/03/13/sobre-a-histeria-nuclear/

http://www.theregister.co.uk/2011/03/14/fukushiima_analysis/

Bushwacker disse...

It was really touching to see there is a concern to keep the tragedy and the horrors of an atomic bomb ever fresh in people's minds so that it never happen again.


Fender Flares | It's All About Car