Na minha última participação na Rádio GP, há cerca de três semanas, discutíamos a situação na equipe McLaren quando levantou-se a questão se Fernando Alonso era primordial para ajudar a equipe no desenvolvimento do MP4-22. Respondi que não, porque atualmente o desenvolvimento de um Fórmula 1 fica praticamente apenas a cargo dos engenheiros, com o piloto tendo uma influência mínima neste trabalho.
Alguns ouvintes, como Jaime Caimar e Becken Lima, me escreveram pedindo um aprofundamento no assunto. Bem, em primeiro lugar, é preciso distinguir a diferença entre “desenvolver” e “acertar” um carro de corridas. Cada bólido, ao nascer, tem diversas características gerais, relativas a potência, torque, estabilidade nas freadas, tendência nas curvas (sair de frente, ser neutro, ou sair de traseira), etc. O trabalho de desenvolvimento constitui em otimizar algumas destas características ou reverter outras, de acordo com a avaliação do grupo de técnicos envolvidos no projeto, tudo em busca de uma melhor performance geral. Quem faz este trabalho na Fórmula 1 hoje em dia são os engenheiros.
Já o acerto do carro consiste em adaptar estas características gerais do carro para cada pista. Aqui, o piloto tem uma parcela maior no trabalho, ajudando os engenheiros a entender o comportamento do carro em diversos pontos do circuito. Aqui, e só aqui, um piloto mais experiente pode fazer alguma diferença por sentir e por conseguir dizer com mais clareza como o carro se comporta. Por isso, às vezes se vê um piloto dizer que está “perdido no acerto”, durante um fim-de-semana. Isto significa que as mudanças feitas em decorrência da leitura que ele fez do carro acabam não dando resultado.
Mesmo assim, com uma telemetria tão avançada, muitos engenheiros conseguem deixar o carro mais ao gosto do piloto ainda que este não se faça claro na hora das conversas e dos briefings. Basta conhecer bem o carro e o gosto do cliente.
Abaixo, vai uma declaração sobre o assunto do engenheiro-chefe da Toyota, o alemão Dieter Gass, em uma entrevista publicada nesta semana no semanário suíço MotorSport Aktuell, feito por Norbert Ockenga e traduzido por este que vos tecla:
“O Feedback dos pilotos ainda é importante. Mas ele serve apenas para constatar como atuam as mudanças que fazemos no acerto do carro. Isso pode nos levar a pender a análise de dados e o desenvolvimento do carro em determinada direção. Mas um piloto não consegue dizer em detalhes o que deve ser feito, principalmente em relação à aerodinâmica. Porém, é claro que eles podem nos dizer como o equilíbrio do carro muda durante uma curva: por exemplo, quando no meio da curva o carro sai mais de frente do que na entrada, ou na saída dela. Isto nos permite tirar conclusões sobre que direção o desenvolvimento deve seguir”.
Acho que ficou mais claro, não?
+++
Falando em MotorSport Aktuell, a publicação – para mim, de longe a melhor do mundo – conta com um brasileiro na equipe. É o experiente Mario Bauer, filho de alemães e com vasta experiência no automobilismo e na Fórmula 1. Além de escrever muito bem (em alemão e português) e de ser muito bem informado, ele criou há pouco tempo um blog, o Grand Prix Insider. Para mim, já virou referência obrigatória. Não deixe de passar por lá!
3 comentários:
Taí mais um excelente blog. Conheci há pouco, graças a um link postado numa notícia do GrandePremio.
Ico,
Muito obrigado pela matéria e pelo respeito demonstrado aos leitores do seu blog e ouvintes da Rádio Gp.
Eu e o Becken discordamos bastante sobre este ponto em questão, pois eu acho que o piloto no acerto do carro faz a diferença e também achava que a experiência e competência do piloto ajudavam no desenvolvimento do carro e pelo que foi exposto por você quanto ao desenvolvimento do carro não é bem assim.
Novamente obrigado.
Jaime Caimar.
Obrigado a vocês, Jaime, pelo prestígio e audiência! :-)
Postar um comentário