FIM DA NOVELA

Fernando Alonso sorriu como criança que acabou de receber um presente de Natal ao término das entrevistas de hoje. Havia acabado de responder de maneira ponderada e inteligente às perguntas feitas primeiro em inglês, depois em espanhol. Negou a informação de que levaria gente de sua confiança para a Ferrari, assegurou que espera total igualdade de condições na operação da equipe e que a briga com Massa será dura, mas que ambos trabalharão juntos, em primeira linha, para derrotar os outros adversários antes de duelarem entre si. E garantiu que terá apoio dos tifosi, mesmo depois de apontar favorecimento da FIA à Ferrari em 2006 e de ter tomado parte no caso de espionagem industrial quando corria para a McLaren. Águas passadas, garantiu, é hora de olhar para frente. E anteviu uma derrota para Massa no primeiro duelo que farão pela Ferrari, quando forem esquiar nas montanhas de Madonna di Campiglio. “Não terei a menor chance”, admitiu, dentes à mostra.

Nesta quinta, ficou claro para mim que o espanhol chega à equipe por decisão de Stefano Domenicali. Tive uma entrevista reservada com ele antes da conversa com Alonso, junto de uma jornalista alemã. E seu discurso foi o de celebrar uma Ferrari mais “latina” – um sinal claro de desaprovação ao absoluto descaso de Kimi Raikkonen com seu entorno quando não está dentro do cockpit. Bernie Ecclestone realmente matou a charada quando comentou, no post abaixo, que o problema do finlandês com a Ferrari foi de “cultura”. Importante notar que Kimi, aposta do presidente, decepcionou depois de ganhar o título de 2007 (em que pese sua recente onda de motivação e resultados). Agora é a vez de Fernando, a aposta do “treinador” Domenicali.

Difícil antever se essa combinação pode dar problema. Contrariando a maioria dos colegas da sala de imprensa, acredito que ela funcionará bem. Felipe Massa tem um histórico de boas relações com seus companheiros de equipe – virou até amigo de Jacques Villeneuve, que o criticara muito no passado. E Fernando Alonso pode ser marrento e imprevisível, mas tem ótimas relações com gente como Giancarlo Fisichella e Jarno Trulli, uma amizade semeada quando correu com eles na Renault.

Também tive a chance de conversar com Lewis Hamilton e lhe perguntei como foi seu trabalho com Alonso. “Pode ser que não éramos muito próximos, mas também não houve nenhum tipo de problema comigo. Até jogávamos basquete no Playstation no motorhome com alguma freqüência”. O campeão mundial aponta que a Ferrari terá a dupla mais forte do grid ano que vem, mas deu uma cutucada quando soube das juras de amor do espanhol para a Ferrari. “Quando ele chegou aqui, também havia dito que seu sonho de infância era correr pela McLaren. Tudo bem, as pessoas podem ter mais de um sonho”, riu.

Quem parece viver um sonho é a imprensa espanhola. Alguns passaram o dia cantarolando como alguém apaixonado. Outros nos procuraram para o aluguel. “Fernando vai carcar o Felipe, ele está fodido”, diziam, enquanto alternavam movimentos com o braço e a pélvis. Tomaram que passem esta postura – para mim, deturpada – para seus leitores. Eu não tenho dúvidas que Massa voltará exibindo a forma de sempre e sua velocidade pode colocá-lo à frente do espanhol no grid com mais freqüência do que os colegas (e o próprio Alonso) esperam. E todos sabem que ser superado pelo companheiro de equipe é o que tira o bicampeão do sério.

Acho que vai ser um duelo interno espetacular, do mesmo nível que espero ver entre Lewis Hamilton e Kimi Raikkonen na McLaren. Brigas sem “carcadas”. E, tomara, sem guerras de bastidores e jogos psicológicos. Que o melhor prevaleça em ambas as garagens.