quarta-feira, 14 de julho de 2010

WOOD BURCOTE

O mais legal da cobertura da Fórmula 1 é a versatilidade. De informações, de histórias e, principalmente, de lugares. Em um mês, passei de uma metrópole vibrante como Montreal para o ar mediterrâneo de Valência e fui parar em... Wood Burcote!

Não dá nem para chamar de cidade. Na verdade, é pouco mais que uma dezena de casas, uns 40 habitantes no máximo, além de uma extensa população de coelhos que cruzam calmamente os jardins nas primeiras horas da manhã, um fenômeno que pude observar todos os dias por lá. A coisa é tão pessoal que as habitações não tem números, mas nomes!

A casa em que eu me hospedei se chamava “Plum Cottage” e é um verdadeiro testemunho do passar do tempo. Construída inicialmente em 1590, ela foi ampliada aos poucos. E ajustada: com o passar dos anos, o chão foi rebaixado, o que gera a curiosidade do último degrau (para quem desce, primeiro para quem sobe) ser bem maior que os outros. “As pessoas eram bem mais baixas quando construíram aqui”, explica Mike, o dono do lugar, cujos traços do rosto são definitivamente os de um Hobbit, um autêntico Tûk ou um Brandebuque.
A porta de cor púrpura dá o toque final no “Bed & Breakfast” que, no fundo, se resume muito a isto mesmo. Todas as manhãs, lá está Mike, solícito, fazendo torradas, café e chá para a trupe de nômades que toma seu território de assalto naquela agitada semana de GP da Inglaterra. “É claro que há o interesse no dinheiro, mas eu gosto também de ver de perto como é o trabalho de vocês”, conta ele, frisando o episódio do ano anterior, quando a notícia de que a FOTA faria um campeonato paralelo estourou além da meia-noite do horário local, e o reservado inglês viu a sala de sua casa, onde fica o roteador da Internet, se transformar numa redação improvisada de rádio e jornal.

Wood Burcote ainda tem a enorme vantagem de ficar a pouco mais de uma milha (sim, com o passar dos dias você se acostuma a dirigir na mão inglesa e a pensar no sistema de medidas deles) de Towcester. É lá que fica o “Rice Bowl”, um restaurante chinês que faz um delicioso pato desfiado e que há décadas é freqüentado por pilotos – Ayrton Senna era um freguês entusiasmado do local – e jornalistas. A família que cuida local já ganhou uma ou duas gerações, mas nos trata com a mesma simpatia de sempre, é o que garantem os escribas mais experientes.

E nós continuamos e continuaremos indo lá. Porque, no entorno da pista que há 60 anos foi o berço do Mundial da Fórmula 1, o que mais se respira é tradição. Nos campos bucólicos de Wood Burcote, nas histórias de vida testemunhadas pelas paredes do Plum Cottage, na cerveja encorpada dos pubs locais, no sabor inigualável do pato do Rice Bowl. Os anos passam e Silverstone continua sendo, sempre, um dos GPs mais especiais do ano.

(Fotos Luis Fernando Ramos)

5 comentários:

Unknown disse...

Ô Ico:
Esse local e sua crônica só me faz sentir mais vontade de estar por aí, curtindo a vida na intensidade de quem sabe gostar do que é relevante e inesquecível.
Saudades grandes.

Anônimo disse...

ICO, mais um lugar para visitar quando formos a SILVESTONE.
VALEU.

Paulo disse...

Depois da saga no retorno da China, tinha que parar em uma toca Hobbit!

José Inácio Pilar disse...

Muito bacana!Gosto do blog porque além de técnico, ele traz também o lado humano da F-1, além de boa música, claro!

Anônimo disse...

Que beleza, meu caro!

Vim parar aqui por indicação de um amigo, e vejo que foi uma ótima escolha.

Parabéns pelo blog! =)