quinta-feira, 28 de outubro de 2010

O HOMEM QUE CALCULAVA

Uma das melhores características de Bernie Ecclestone é o senso de humor. No último GP da Coreia, ele buscava passar aos jornalistas sua satisfação com o esforço dos organizadores locais em aprontar o circuito a tempo para a realização do evento. Um inglês perguntou se ele não estaria preocupado com a condição escorregadia do asfalto.

- Escorregadio? Hmmmm, então vou me certificar de não andar por lá. Desta vez, não irei ao grid de largada - respondeu, deixando claro ao escriba que, aos 80 anos, ele não é um piloto em atividade. Todos em volta, claro, entenderam a mensagem e riram bastante.

Essa capacidade de estar sempre um passo à frente de seus interlocutores é o principal segredo do sucesso de Charles Bernard Ecclestone, um inglês de origem humilde que aprendeu rapidamente a fazer dinheiro na delicada economia inglesa pós-II Guerra como vendedor de carros usados.

Reza a lenda que os principais vendedores da região de Londres se reuniam semanalmente para um comércio interno de carros que ia noite adentro. Era como uma bolsa de valores, onde alguém colocava um modelo na roda e ele ia sendo comprado e vendido várias vezes em poucas horas. Especulação pura.

Malandro, Ecclestone percebeu que poderia ganhar um extra colocando à venda carros que não existiam: ele vendia a “jóia” por um bom preço no início da noite e certificava-se de comprá-la de volta no final, quase sempre por um valor bem menor depois de inúmeras rodadas especulativas com seus colegas.

No fundo, ele usou de tática parecida para ganhar uma fortuna com a Fórmula 1. Inicialmente como empresário de pilotos e depois como dono da equipe Brabham, ele percebeu como o potencial comercial da categoria estava diluído entre organizadores de corridas sem escrúpulos e dirigentes retrógados.

Como chefe da associação das equipes, assumiu as rédeas do negócio e tomou para si o direito de comercializar a F-1, um produto que estava ali, mas não existia. Foi o que bastou para passar a Brabham para frente. Hoje, ironia maior, ele é o grande opositor das aspirações comercias das equipes da F-1. E costuma ser bem-sucedido nas quedas-de-braço com elas.

O fato da F-1 ser um evento de incrível alcance mundial é mérito de Ecclestone. Que reconhece o fato dos valores esportivos ficarem um pouco sacrificados. Há alguns anos ele soltou o seguinte comentário durante um GP de carros históricos em Mônaco: “Incrível. Igualzinho a como era a F-1 antes que eu fodesse com tudo”.

Nessa brincadeira reside o grande paradoxo que envolve a vida do octagenário baixinho. Em nome do dinheiro, a categoria se fechou e se distanciou do público, os pilotos passaram a ter de controlar o que dizem pois viraram representantes de marcas e o esporte passou para um segundo plano.

Por outro lado, a F-1 tem um alcance similar ao de uma Olimpíada ou de uma Copa do Mundo, mas que realiza seu show a cada duas semanas ao invés de quatro anos. Domingo sim, domingo não, milhões de pessoas no mundo sintonizam suas telinhas para assistir ao desfile dos carrinhos coloridos - e isso mesmo quando as corridas são chatas. O cara é ou não é um gênio do marketing?

O futuro da F-1 sem Ecclestone? Bem. Sua diretriz comercial prega que a categoria deve estar presente nas maiores economias mundiais. Isso explica a chegada de GPs na Coreia do Sul, Índia e Rússia, além da volta aos Estados Unidos. E garante uma certa tranquilidade para o GP do Brasil. Dentro dessa lógica, a volta da realização de uma prova no México é questão de tempo.

Sobre possíveis sucessores, sempre falam em Flavio Briatore - o que seria lamentável para o esporte. Já ouvi falar também de Gerhard Berger, um sujeito mais carismático, como o próprio Bernie. Mas, vai saber, quem sabe virá algum executivo do qual nunca ouvimos falar, ou mesmo a bela Tamara. O que importa? Afinal, Mr. E completa hoje 80 verões. Sem demonstrar o menor sinal de cansaço.

(Foto Luis Fernando Ramos)

5 comentários:

Anselmo Coyote disse...

Uma faca de dois legumes... rs.

A F1 poderia ter o mesmo apelo comercial do mundial de kart, menos que isso ou nem existir mais.

Como empreendimento negocial o lucro ocupará sempre o topo de sua lista de prioridades e para ser exitoso deve primar por encher os olhos do seu público-alvo e, por isso mesmo, sua condução não pode desviar os olhos da dinâmica sócio-mercadológica.

Talvez por isso mesmo o velhinho, demonstrando mais uma vez sua capacidade de estar à frente de seu tempo, esteja nesse momento refreando certas atitudes louváveis num passado recente, inclusive as próprias.

Do ponto de vista de expectador aspiro muitas melhoras.

Abs.

]Muguello[ disse...

Quem eh Tamara?

Ron Groo disse...

Sabe, apesar de muitos me chamarem de louco eu consigo nutrir certa simpatia pelo Ecclestone.

Ele tirou a F1 da idade média e transformou em um dos negócios mais bem organizados do mundo, sem contar que ganhou dinheiro a rodo. E seu humor é uma coisa maluca... Depois de receber o andador Red Bull mandou o dedo médio para as cameras colocando o politicamente correto no chinelo.

Tem o lance todo das corridas irem ficando chatas, os autodromos serem trocados e tal... Mas não se faz omelete sem quebrar ovos.

Unknown disse...

Mugello, a filha do chefe.. google por "Tamara Ecclestone".
ai ai... bem que ela poderia tocar o barco mesmo..

E adoro o livro que entitula o post.

Felipe Playmobil disse...

- Grande Ico, voce que é os nossos olhos nos GP's de F1 pode me dizer se as ameaças do anãocclestone ao GP do Brasil são reais, blefes, ou ele reclama pra que se melhore o circuito, principamente a area dos boxes que dizem ser pequena para os equipamentos das equipes.

Abraço.